Feiras do Livro de Lisboa e Porto, APEL,
dinheiros públicos, uma novela venezuelana com política e farturas à
mistura. Nos últimos anos, quase sempre na hora H, a Associação Portuguesa de
Editores e Livreiros (!) avisa que a realização da feira está em perigo, por
um fio de ovos, por um cabelo de serafim. A Cultura passa-se, faça-se um novo
25 de Abril e a feira lá se faz, num qualquer Abril com frio e chuva ou num
Maio/Junho mais soalheiros. As polémicas são muitas — barracas novas ou
antigas, maiores ou mais pequenas, iguais para todos, umas mais iguais do que
outras ou todas iguais todas diferentes, se há casas-de-banho portáteis,
descartáveis, unissexo ou se vamos todos à mata da estufa-fria —, um ai jesus
que se a-paga a luz. O drama do financiamento é o que mais confusão gera e,
como é tradição, só à última se assinam os protocolos com os presidentes ou
vereadores dos respectivos municípios e restantes entidades. É neste ponto que deixo de
perceber as coisas. E deixo de perceber porque nunca fui boa a matemática,
confesso, mas, sobretudo, porque até hoje nunca ninguém me mostrou os números concretos e me explicou como se fazem as contas.
Se as Câmaras cedem o local para a realização da
feira, se os editores e livreiros participantes pagam à organização o espaço que ocupam e
se esta ainda angaria verbas com patrocínios de privados (50 000 € ao
todo? mais? menos?), não é possível encontrar um modelo de feira que seja
sustentável sem pedir a uma Câmara Municipal 75 000 € por ano (!) mais fornecimento
de animação cultural? Os editores e livreiros
conseguiram-no no passado. Se hoje não conseguem fazer a feira de forma
sustentável ou inventar novos modelos de feira, que sirvam melhor os seus interesses
e os do público, talvez não sejam tão capazes como deviam. Ou sou eu que estou
a ver tudo mal? De qualquer das maneiras, não me parece que a coisa seja problema
da Câmara, sobretudo num momento em que 75 000 € são mais bem empregues
em apoios sociais, por exemplo, que tanta falta fazem.
As feiras são muito interessantes, as pessoas da
APEL são muito simpáticas, os custos com a organização das feiras (montagens,
etc.) não são, com certeza, despiciendos, mas alguém tem de fazer alguma coisa
de diferente se as feiras forem para continuar. E esse alguém não são as
Câmaras, parece-me. Quando um acontecimento deste cariz só se realiza se houver subsídios (ou incentivos, parcerias, sinergias ou o que quiserem chamar-lhe) desta natureza, algo
está podre no reino da Dinamarca.
E agora, aqui fica o excerto de uma notícia (é mesmo
uma notícia, não estou a brincar, limitei-me a sublinhar):
Confrontada no ano passado com um pedido de renovação do apoio anual,
de 75 mil euros, acordado em 2009 e que vigorou até 2012, a autarquia
recusou. "A Feira do Livro é uma actividade comercial desenvolvida por
empresas privadas, pelo que se exige da câmara rigorosos critérios,
particularmente nestas circunstâncias, na utilização de dinheiros
públicos. Ainda assim, o município sempre reafirmou à APEL a sua
disponibilidade para continuar a apoiar tão importante iniciativa,
nomeadamente a ceder gratuitamente, para o efeito, a plataforma central
da Av. dos Aliados, isentando a organização de todas as taxas e
licenças, e assegurando apoio logístico na segurança e na limpeza dos
espaços de circulação".
Para além da questão financeira, a APEL não gostou de ser tratada como "mera arrendatária de um espaço" na cidade, explicou ao PÚBLICO o vice-presidente da associação, Pedro Pereira da Silva. Ao contrário do que acontece na feira de Lisboa, cujo sucesso os livreiros atribuem ao "espírito de parceria" com que a autarquia encara o evento, no Porto, assinala o dirigente da APEL, a câmara não deu também resposta aos pedidos para um maior envolvimento seu na animação cultural dos Aliados durante as semanas do certame.
Pedro Silva Pereira assinalou ainda que a manutenção do apoio da autarquia permitiria compensar a diminuição dos valores pedidos aos livreiros para participação na feira, condição necessária, em anos de crise acentuada, para garantir uma oferta alargada e minimizar os riscos de prejuízos. Mas, para a autarquia, "não podem ser os contribuintes a suportar os riscos de uma eventual quebra das vendas".
Para além da questão financeira, a APEL não gostou de ser tratada como "mera arrendatária de um espaço" na cidade, explicou ao PÚBLICO o vice-presidente da associação, Pedro Pereira da Silva. Ao contrário do que acontece na feira de Lisboa, cujo sucesso os livreiros atribuem ao "espírito de parceria" com que a autarquia encara o evento, no Porto, assinala o dirigente da APEL, a câmara não deu também resposta aos pedidos para um maior envolvimento seu na animação cultural dos Aliados durante as semanas do certame.
Pedro Silva Pereira assinalou ainda que a manutenção do apoio da autarquia permitiria compensar a diminuição dos valores pedidos aos livreiros para participação na feira, condição necessária, em anos de crise acentuada, para garantir uma oferta alargada e minimizar os riscos de prejuízos. Mas, para a autarquia, "não podem ser os contribuintes a suportar os riscos de uma eventual quebra das vendas".
PS: gosto especialmente da parte do artigo que diz «Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) espera realizar a 83.ª edição em 2014, já com outros protagonistas na Câmara do Porto.»
Actualização: saiu mais uma notícia sobre o assunto, aqui. Mais dados, o problema é o mesmo.
Actualização: saiu mais uma notícia sobre o assunto, aqui. Mais dados, o problema é o mesmo.
1 comentário:
Concordo em absoluto. Ora aqui está uma situação em que a dependência dos apoios estatais é absurda, oportunista e desnecessária.
Enviar um comentário