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19.4.13

Feirar ou não feirar, eis a questão

Feiras do Livro de Lisboa e Porto, APEL, dinheiros públicos, uma novela venezuelana com política e farturas à mistura. Nos últimos anos, quase sempre na hora H, a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (!) avisa que a realização da feira está em perigo, por um fio de ovos, por um cabelo de serafim. A Cultura passa-se, faça-se um novo 25 de Abril e a feira lá se faz, num qualquer Abril com frio e chuva ou num Maio/Junho mais soalheiros. As polémicas são muitas — barracas novas ou antigas, maiores ou mais pequenas, iguais para todos, umas mais iguais do que outras ou todas iguais todas diferentes, se há casas-de-banho portáteis, descartáveis, unissexo ou se vamos todos à mata da estufa-fria —, um ai jesus que se a-paga a luz. O drama do financiamento é o que mais confusão gera e, como é tradição, só à última se assinam os protocolos com os presidentes ou vereadores dos respectivos municípios e restantes entidades. É neste ponto que deixo de perceber as coisas. E deixo de perceber porque nunca fui boa a matemática, confesso, mas, sobretudo, porque até hoje nunca ninguém me mostrou os números concretos e me explicou como se fazem as contas.

Se as Câmaras cedem o local para a realização da feira, se os editores e livreiros participantes pagam à organização o espaço que ocupam e se esta ainda angaria verbas com patrocínios de privados (50 000 € ao todo? mais? menos?), não é possível encontrar um modelo de feira que seja sustentável sem pedir a uma Câmara Municipal 75 000 € por ano (!) mais fornecimento de animação cultural? Os editores e livreiros conseguiram-no no passado. Se hoje não conseguem fazer a feira de forma sustentável ou inventar novos modelos de feira, que sirvam melhor os seus interesses e os do público, talvez não sejam tão capazes como deviam. Ou sou eu que estou a ver tudo mal? De qualquer das maneiras, não me parece que a coisa seja problema da Câmara, sobretudo num momento em que 75 000 € são mais bem empregues em apoios sociais, por exemplo, que tanta falta fazem. 

As feiras são muito interessantes, as pessoas da APEL são muito simpáticas, os custos com a organização das feiras (montagens, etc.) não são, com certeza, despiciendos, mas alguém tem de fazer alguma coisa de diferente se as feiras forem para continuar. E esse alguém não são as Câmaras, parece-me. Quando um acontecimento deste cariz se realiza se houver subsídios (ou incentivos, parcerias, sinergias ou o que quiserem chamar-lhe) desta natureza, algo está podre no reino da Dinamarca. 

E agora, aqui fica o excerto de uma notícia (é mesmo uma notícia, não estou a brincar, limitei-me a sublinhar):

Confrontada no ano passado com um pedido de renovação do apoio anual, de 75 mil euros, acordado em 2009 e que vigorou até 2012, a autarquia recusou. "A Feira do Livro é uma actividade comercial desenvolvida por empresas privadas, pelo que se exige da câmara rigorosos critérios, particularmente nestas circunstâncias, na utilização de dinheiros públicos. Ainda assim, o município sempre reafirmou à APEL a sua disponibilidade para continuar a apoiar tão importante iniciativa, nomeadamente a ceder gratuitamente, para o efeito, a plataforma central da Av. dos Aliados, isentando a organização de todas as taxas e licenças, e assegurando apoio logístico na segurança e na limpeza dos espaços de circulação".

Para além da questão financeira, a APEL não gostou de ser tratada como "mera arrendatária de um espaço" na cidade, explicou ao PÚBLICO o vice-presidente da associação, Pedro Pereira da Silva. Ao contrário do que acontece na feira de Lisboa, cujo sucesso os livreiros atribuem ao "espírito de parceria" com que a autarquia encara o evento, no Porto, assinala o dirigente da APEL, a câmara não deu também resposta aos pedidos para um maior envolvimento seu na animação cultural dos Aliados durante as semanas do certame.

Pedro Silva Pereira assinalou ainda que a manutenção do apoio da autarquia permitiria compensar a diminuição dos valores pedidos aos livreiros para participação na feira, condição necessária, em anos de crise acentuada, para garantir uma oferta alargada e minimizar os riscos de prejuízos. Mas, para a autarquia, "não podem ser os contribuintes a suportar os riscos de uma eventual quebra das vendas".


PS: gosto especialmente da parte do artigo que diz «Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) espera realizar a 83.ª edição em 2014, já com outros protagonistas na Câmara do Porto


Actualização: saiu mais uma notícia sobre o assunto, aqui. Mais dados, o problema é o mesmo.

1 comentário:

maniadochocolate disse...

Concordo em absoluto. Ora aqui está uma situação em que a dependência dos apoios estatais é absurda, oportunista e desnecessária.